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O brasileiro chocado

Desembarco em Guarulhos como se apenas para ouvir uma mesma pergunta, da boca de jovens e velhos, altos e baixos, gordos e magros: querem todos saber se estou “chocado” com “as coisas do Brasil”. Todas essas pessoas partem do pressuposto de que, morando fora do país, em poucos anos perdemos de vista “a nossa incivilidade” ou “o quanto somos bárbaros”. Em outras palavras, acredita-se que o exilado se esquece de caminhar aterrorizado pelas ruas, de não confiar em que os carros parem, como se espera deles, nos sinais vermelhos, e assim por diante.

Reconheço que algo assim possa acontecer a alguém ao cabo de muito tempo no exterior. Algo como vinte anos, como no caso do protagonista daquele que considero um dos melhores filmes brasileiros da última década, embora pouquíssimo aplaudido: O Príncipe (2002, Ugo Giorgetti). Mas três anos e meio é muito pouco para tanto choque. Sei muito bem que temos assaltos e golpes, atropelamentos e deslizamentos de encostas. Por outro lado, também sei que muito brasileiro esnobe vai passar um período fora, brevíssimo, em intercâmbio, por exemplo, e isso já basta para que volte “chocado” com o Brasil. Solução: não leve a sério esse tipo. Quem realmente esteve fora por longas temporadas, quando chega sente mesmo é vontade de comer picanha e tomar cerveja gelada. Só vai pensar em choques muito tempo depois.

Mas tenho uma dica ao companheiro de exílio, você que vem passar umas férias com a família no Brasil, você que ainda não veio visitar os amigos. Vamos a ela: jamais dê de ombros a essa pergunta fatal. Nem ouse argumentar que nossa incivilidade também não é tanta e existe, em grau menor, maior ou igual (pouco importa) em todo canto, à exceção, talvez, da Suécia. Evite a todo custo exibir otimismo com o país. Se tiver o instinto de avaliar que há menos gente dormindo na rua, por exemplo, engula as palavras. Se há uma coisa que não mudou no Brasil, ou melhor, no brasileiro, e está longe de ser um choque para mim, é a exigência frenética, doentia, de consenso. Talvez seja fruto do nosso infame e gravíssimo quase-monopólio de mídia, sei lá eu. Mas é incrível e, cá entre nós, um tanto perturbador.

Uma das cláusulas desse consenso pressuposto e compulsório diz que não há nada mais irrecuperável e estragado do que nosso belo e melancólico país. Se a economia cresce, é uma sorte que já vai passar (ouvi isso tantas vezes, desde que cheguei!). Aliás, para muitos, não é sorte do país, mas do partido que está no poder, o que me soa bastante insólito. Se vamos sediar uma Copa do Mundo, é porque houve acordos inconfessáveis de bastidores, como se o lobby fosse invenção brasileira (antes fosse). O negativismo é de rigor, e ai de quem destoe! Portanto, amigo exilado, simule indignação e concorde, se não quiser perder os amigos e o couro.

A negatividade é mais grave, creio eu, no Rio de Janeiro, que foi cidade realmente maravilhosa e vive há trinta anos sob o domínio da decadência e da desfaçatez. O resultado, potencializado por um monopólio de mídia que há muito já passou do quase, é um povo que deseja ardentemente o derrotismo, a humilhação, a vergonha. É uma espécie de síndrome de Estocolmo auto-aplicada. O carioca está tão convencido de que só é possível vencer por meio de maracutaias que, quando surge um triunfo limpo, ele é logo assoberbado por despeito e sabotagem. Já é consenso que a Olimpíada será um fracasso, por exemplo, embora seu sucesso dependa apenas de uma breve concentração de esforços, leia-se boa vontade, isto é, força de vontade.

Estou escaldado. Fui dizer que o astral das pessoas nas ruas parecia melhor e já ouvi que provavelmente tinha visto bêbados. Fui dizer que as ruas pareciam mais limpas e ouvi que era para enganar turistas. Fui dizer que havia menos mendigos e ouvi que eles tinham mudado de área, sei lá com que intenção. A infelicidade, neste país e, particularmente, nesta cidade, se tornou tão obrigatória quanto a vistoria de veículos. Isso seria chocante, se eu já não estivesse careca de saber. Eu e minha mania de querer discordar dos outros! Devo ter perdido muitas amizades assim, de gente que hoje talvez me considere meio amalucado.

Mas já que o tema é choque, há uma coisa, sim, que me chocou. Trata-se da rádio USP, de São Paulo (naturalmente), FM 93,7. Era uma de minhas rádios preferidas, a única que tocava a boa música brasileira regularmente, sem se aproveitar da sigla “MPB” para nos obrigar a ouvir pop-zinhos totalmente desqualificados. Sintonizei-a e, para minha grande surpresa, tocava uma daquelas músicas dançantes americanas dos anos 80 que se ouvem em tantas outras estações. É claro que tomei um susto. Fui perguntar a amigos e fui informado de que, de fato, a programação mudou.

Não é chocante? A única emissora paulistana em que se podia escutar de Paulinho da Viola a Jacob do Bandolim passou a se dedicar a A-ha e Duran Duran. Por quê? Falta de público? Mas estamos falando de uma estação estadual, ligada à principal universidade do Estado. Não deveria ela preocupar-se mais com a difusão cultural do que com o lucro imediato? Uma rádio pública é um investimento, ou seja, tem um custo. Por que encarar esse custo, se o produto final é só mais uma concorrente de todas as outras rádios, privadas, oferecendo o mesmo produto que elas, ou seja, algo que podemos tranqüilamente ouvir em qualquer estação? O que está por trás dessa mudança? Quem teve a idéia? Eis aí uma das mais chocantes “coisas do Brasil”…

PS: A belíssima e formidável artista que guardo em casa está apresentando sua peça Strindbergman no espaço cultural Sergio Porto, Rio de Janeiro, Humaitá, às quartas e quintas, 21h. Em Paris e São Paulo, foi um sucesso inquestionável. Vejamos agora a quantas anda o bom gosto dos cariocas. O site do espetáculo é www.strindbergman.com.

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Os bastidores da Apollo 11

Um diálogo curto, para dar um pitaco na efeméride do momento: homem na lua.

É que Neil Armstrong sempre me pareceu meio reticente ao pronunciar sua famosa frase. Como se ele não estivesse muito contente com o que dizia. É evidente que o astronauta não pensou o texto na hora, nem foi ele que o preparou. Mas até que ponto ele concordava com o famoso “it’s one small step for a man, one giant leap for mankind”? Talvez lhe parecesse cafona.

Imagino Neil na cafeteria, de manhã bem cedinho, tomando seu chafé com bacon e ovos, discutindo detalhes da missão com Buzz Aldrin e the other guy. Eles estão se fazendo de relaxados, rindo nervosos, contando piadas ruins. Entra um homem jovem, engravatado e engomado, carregando uma pasta. Ele dá bom-dia a todos, todos respondem em tom arrastado: “Bom dia, Al”.

Ninguém gosta desse Al. É um almofadinha.

Al coloca a pasta sobre a mesa e tira uns papéis. Pergunta aos três: quem vai ser o primeiro? Buzz e the other guy apontam para Neil, que ergue o dedo, fingindo que seu orgulho é fingido. Al, timidamente, se dirige a ele e lhe passa uma folha.

– Seu discurso está pronto.

Neil faz cara de amuado, mas toma o papel e um gole de chafé, cada um com uma mão, e lê o que está escrito.

– Você não quer que eu diga isso, quer?

– Nossos melhores redatores passaram semanas preparando o texto.

Incrédulo, Neil retoma a leitura:

– “Um pequeno passo para um homem…” que ridículo! Vai estar na cara que é ensaiado.

– Não faz mal.

– Eu vou me sentir um idiota.

– Não faz mal.

Naturalmente, o futuro primeiro homem na lua se exalta. Está afogueado e os perdigotos que solta atingem Aldrin e the other guy.

– Como é que é?
– É pela América. Os vermelhos vão ver só. Você é nosso herói, man!

-Pela América, my ass!

O herói nacional levanta-se. Al dá um passo atrás. Os outros dois astronautas ficam preocupados.

-É uma frase para a história, Neil.

-É, Neil, fica frio! (é a tradução que daria a dublagem da Globo.)

– Pra história, é? Então é pra falar com voz empostada? Um pe-que-no pas-so pa-ra um ho-mem… é isso?

– Vai ficar horrível.

– Vai ficar horrível de qualquer maneira. Deveria ser meu dia de glória! Pisar na lua! Buzz, não quer ser o primeiro?

– Tô fora! Você acha que eu vou fazer o discurso cafona?

– Al, por favor…

– Houston já decidiu. Agora, se me dão licença…

Al faz uma curta reverência e se retira. De costas, os astronautas não vêem seu ar triunfal, como o de um garotinho que acaba de fazer uma travessura. Mal sabe Neil, aquele presunçoso, quem foi que inventou a tal frase. Atrás dele, ainda dá para ouvir os impropérios do primeiro homem na lua:

– Goddamn!

Buzz Aldrin intervém, preocupado:

– Olha as suas coronárias, Neil…

The other guy está alarmado. Corre para o telefone:

– Houston, we have a problem

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O repouso do general

Quando soube que estariam todos fora – demônios, reis, colombinas, palhaços –, concebeu o mal-estar, dramatizou a doença, conquistou a solidão. Livres as paredes para o silêncio, os salões entregues à vibração do tempo baldio, fremiu e suspirou de alívio e apreensão.

Estacou por instantes sem volume. Quando o sangue voltou aos dedos, entregou-se à tarefa solene de desabotoar a farda, pendurá-la no cabide, encerrá-la na escuridão do guarda-roupa. Puxou dos ombros os galardões cheios de estrelas, apertou-os na palma da mão e os depositou na gaveta. Fora de vista, mas não de alcance. Para o caso de precisar buscá-los às pressas.

Seria lá o repouso do general. Nada de respostas, nada de comandos e decisões. A camisa de algodão lhe caía esquisita, mas agradável. Como trocar de pele.

Respiração caprichada, caminhou a passos arrastados até a poltrona. E se instalou, rijo, como numa sala de interrogatório. Conforme o previsto.

Só então ousou um lançar de olhos para o volume que trazia entre as mãos. O objeto grande, pesado e viscoso, coberto por um pano branco tão limpo, liso, fragrante – por que não dizer: imaculado. Tantos anos à espera do momento de encarar a carga, tantos anos, pareciam uma vida inteira. A exemplo da vida, não tinham começo na memória. Que esforço, que heroísmo, dar a crer aos outros que aquilo, aquela coisa, era natural. Que sabia o que fazia. Que vagava pela casa carregando um pacote branco com algum propósito. Missão misteriosa, mas incontornável.

Agora que estavam todos fora – demônios, reis, colombinas, palhaços –, era o momento de esclarecer tudo de uma vez por todas. Teve orgulho da coragem com que fitava o volume fantasmagórico. As mãos, porém, suavam. O cotovelo empurrava os dedos para o pano, o ombro os retinha. Homem e objeto, como conjunto, entravam em sintonia com o tempo paralisado.

Sentiu-se ameaçado, espantou-se, puxou por reflexo o lençol, violento. O tecido voou como espectro e pousou como pomba. Ficou espalhado sobre o assoalho, inerte.

Diante de seus olhos, o volume descoberto. Como antes, não sabia o que era. Não podia descrever a forma. Irregular e perfeitamente simétrico. Opaco ao extremo. Difuso, fora de questão. Solidez opressiva que se esvaía rumo ao chão. Por hábito, desandou a dar nomes: é o mundo, é minha alma, é o passado.

De súbito, faltou fôlego. Cessou a confusão do batismo cego. Poderia decidir-se por qualquer daqueles nomes, ou qualquer outro; subsistiria o mais terrível dos atributos, sempre. O que trazia nas mãos, nelas teria de seguir. Deixasse cair, é certo que espatifaria. O ar seria tomado de imediato pelo vapor venenoso do mundo, da alma, do passado.

Sufocaria. Pereceria. E não conseguia escolher entre o sacrifício sumário, mas horrendo, e a tortura vitalícia de carregar ainda, diante de todos – demônios, reis, colombinas, palhaços –, o volume abjeto, a massa amorfa, coberta pelo mesmo pano branco outrora imaculado, agora encardido com a poeira das cidades.

Na fúria da indecisão, lembrou-se das insígnias ocultas. Esticou-se com cuidado reverente. Não foi à gaveta, mas ao lençol, ainda enrugado a seus pés. A decisão estava tomada sem que alguém a tomasse.

Mesmo para a alma perturbada, à beira do escapismo, era patente. Sublinhavam-no as lágrimas, ao romper o portal. O peito se ergueu em revolta, soluçava e recusava o ar. Debaixo da mortalha, o objeto estremeceu. Poderia deslizar a qualquer instante. Mas não havia controle para os espasmos do corpo entregue.

De uma porta que se cria inexistente, entrou a desconhecida. O susto invocou o sangue das faces e ressuscitou o general. As estrelas das divisas tinham aparência ridícula sobre o algodão dos ombros, mas expunham uma imposição de respeito.

Só não se entregava à deferência o rosto ainda afogueado. A desconhecida flutuava através do salão. Encarou-o e, com expressão indiferente, perguntou o porquê das lágrimas. A resposta saiu refletida, viril como cumpre replicar:

— Não sei… Não sei.

Com isso, ergueu-se e se pôs em marcha, carregando seu fardo, até a escrivaninha do quotidiano.

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Se um estoura, estouram todos (ou O Sapo de La Fontaine)

Sapo gordo prestes a estourar (La Fontaine)
É feio dizer “eu avisei” ou “eu já sabia”; mas acontece que, bem, eu avisei. E eu já sabia. Com as ferramentas rudimentares do raciocínio econômico que tinha aprendido a manusear ao final de uma formação quase involuntária, consegui provar por A+B que, não importa em que direção aponte o gráfico de crescimento do PIB brasileiro, a cidade de São Paulo caminhava com destino certo para o colapso definitivo. Isso, perdoe reiterar, é o que eu dizia há coisa de cinco anos. Mas só hoje, ao tentar discutir soluções para o problema do trânsito, a sociedade e seus governantes percebem o óbvio.

Bem que tento conter o impulso de me vangloriar. Mas lembro dos fins-de-tarde nos botecos da Augusta, contemplando a guerra entre carros, motos e ônibus, tomando cerveja gelada enquanto os afoitos profissionais derretiam na tentativa de voltar a casa; lembro dos amigos a rir, já altos, da exposição detalhada de minha teoria. Lembro que eles consideravam impossível duas tendências opostas darem o mesmo resultado. Enfim, só quero lembrar a eles que estava tudo previsto.

Aqueles meus cálculos contemplavam duas possibilidades, ou seja, um Brasil em franco crescimento econômico, digamos, quase um novo milagre; ou um Brasil estagnado, irremediavelmente estagnado, pior ainda do que foi nos anos 80 e 90. Em ambos os casos, a própria concentração pantagruélica de riqueza na terra que um dia teve garoa se encarregaria de sufocá-la. Vejamos, em primeiro lugar, o que aconteceria se o país não conseguisse retomar o crescimento:

À primeira vista, a idéia não parece má para a vida paulistana. Sem crescimento econômico, vendem-se menos carros, constroem-se menos arranha-céus, menos pessoas se espremem nas plataformas do metrô, menos aviões chegam e partem de Congonhas. Olhando assim, não parece terrível, para a cidade de São Paulo, que o país siga estagnado. Acontece que, como de hábito, a coisa não é tão simples. Mesmo estagnado, o país produz novas pessoas; é gente que precisa encontrar trabalho e, como já se viu durante décadas em nosso país, vai atrás dele onde ele está. Conseqüência: o fluxo de gente em desespero, fugindo da miséria, que chegaria em São Paulo em busca de emprego não deixaria de aumentar. A cidade ficaria ainda mais apinhada, mais favelizada, mais desigual e, bem provavelmente, mais violenta. Em duas palavras, ela sufocaria.

E se o país enriquecesse, (sem redistribuir a economia pelo território)? Nesse caso, o crescimento dos investimentos, o aumento da renda, a queda do desemprego, a pressão por novos empreendimentos – em resumo, tudo que acompanha o crescimento econômico vigoroso – tornaria a cidade intransitável em dois segundos. E irrespirável, naturalmente. O horizonte sumiria de vez, as aeronaves se chocariam, tentando pousar no meio da cidade, o barulho de helicópteros ficaria insuportável; no metrô, um grito de “fogo”, “rato” ou “tarado” causaria uma onda de choque que atiraria os cidadãos mais próximos da linha sobre os trilhos eletrificados (já é assim). O caos, que estava evidente para qualquer um com o mínimo senso de civilização, ficaria patente.

Na última semana, li diversos comentários sobre os recordes de engarrafamento em São Paulo. 180 quilômetros, 190, 200, 220. O metrô teria sido uma solução, mas é tarde, não dá tempo. Tampouco bastaria a proposta de pedágio urbano: por falta de opções, os carros pagariam, mas continuariam circulando quase tanto quanto hoje. Há mais de dez anos, li que o prejuízo com o trânsito, só em São Paulo, passava da casa do bilhão e meio de dólares por ano. Hoje, deve ser o triplo disso. Já era uma cidade em que eu não conseguia trabalhar direito, porque já chegava “no serviço” (como se diz) esgotado. Hoje, tremo de lembrar.

A única solução para São Paulo e, de maneira geral, para o Brasil e suas metrópoles, é repensar nossa lógica econômica. Precisamos tomar consciência de nossa dificuldade em romper com a tradição do Convênio de Taubaté. Eis o ponto-chave nefasto de nossa história, que escancarou, em papel passado, nossa escolha pelo latifúndio. Passamos dos cafeicultores aos industriais, depois aos bancos, mas ainda somos os mesmos. Queremos concentrar a lavoura (em sentido metafórico), queremos crescer com a energia que sugamos dos vizinhos, e ainda acreditamos demais em superlativos: de que vale termos o maior estádio, a segunda maior frota de automóveis e terceira de helicópteros, a maior sala de concertos, as maiores cidades? Do outro lado, o país ainda produz miséria, ignorância e barbárie em profusão. Voltando à realidade de São Paulo, temos uma Berrini que vai se verticalizando, enquanto, ao nível do solo, a vida é, há tempos, insuportável. Má escolha.

Sem desconcentrar a economia, integrar o país e desenvolver as regiões, ou seja, o território como um todo, o país e sua maior cidade estão condenados. É o anátema da cobiça. Mas isso é apenas o evidente. São Paulo, primeiro, cresceu como centro industrial e era um modelo para o resto do país; locomotiva, dizia-se. No meio do caminho, o maquinista parece ter exagerado no carvão; achacado pelo espírito do Convênio de Taubaté, depenou das tábuas os demais vagões, para continuar acelerando. A cidade se pôs a concentrar o setor financeiro, o cultural, o varejista, o esportivo, o editorial, o aéreo…

Faz lembrar o sapo da fábula de La Fontaine, que queria ficar do tamanho de um boi. Foi se enchendo de ar, cresceu, cresceu, até que estourou. No caso de Sampa, o maior problema é que tem um país em volta. Se um sapo estoura, estouram todos. Parece que a barriga do bicho já apresenta algumas rachaduras preocupantes. E as perspectivas de crescimento para o PIB brasileiro em 2008 vão além dos 5% de 2007. Não tem metrô, pedágio ou rodízio que sirva de esparadrapo para um sapo tão inchado.

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