O que segue é a tentativa de levantar um aspecto um pouco escanteado no tema das tarifas de ônibus, que voltou à pauta vigorosamente neste começo de 2015. Tenho a impressão de que, de 2013 para cá, com o desenrolar dos eventos, todos acabamos nos concentrando no velho e grave problema da arbitrariedade policial. Mas, além de tudo que já se discutiu, acho que o assunto, tal como conduzido pelo MPL, contém também algo de enorme importância: uma centelha de repolitização da política. Sei que a frase soa esquisita e foi intencional: quero dizer que, se a nossa política está despolitizada (volto a isso abaixo), apesar de toda a virulência das campanhas eleitorais e a “polarização” que se proclama a cada vez que há um segundo turno, então uma porta está aberta para reintroduzir a política lá onde ela não está, mas deveria. É preciso atravessar essa porta.
Vale a pena começar por um episódio sintomático, ocorrido em pleno período de agitação de 2013. Naquele momento, pressionado pelas ruas e a virada da opinião pública graças às barbeiragens da polícia, o prefeito Fernando Haddad mandou reunir o Conselho da Cidade para discutir as alternativas disponíveis. No dia anterior, reuniu-se com membros do Movimento Passe Livre. Na verdade, mais que discutir, o que o prefeito queria era explicar a racionalidade por trás do cálculo da tarifa. Para tanto, mostrou as planilhas do transporte público, provando por a+b (de acordo com o saber positivo que detém, a ser comentado mais adiante) que o aumento era indispensável, caso contrário o grande projeto – aquele que foi prometido na eleição, pelo qual foi eleito etc. – seria inviável, e que seria preciso escolher entre aumentar o subsídio para manter os três reais da tarifa ou manter os investimentos da prefeitura. Ou, ainda, subir impostos, como chegou a tentar, em sua época, Luiza Erundina – mas foi rejeitada pelos contribuintes municipais. Portanto, nada a fazer senão discutir em Brasília pela mudança da Cide, a renegociação das dívidas de Estados e municípios e assim por diante.
Na ocasião, relatam os presentes – convém frisar: pelo lado da prefeitura, falando em tom paternalista, mostrando-se melhores conhecedores dos imperativos da racionalidade orçamentária –, o prefeito ouviu dos jovens ativistas aquilo que, convenhamos, era óbvio, considerando que a cidade estava paralisada e a opinião pública mobilizada, ou seja, o MPL tinha a faca e o queijo na mão: “as planilhas de custos não nos interessam em nada”. Em outras palavras: nosso negócio não é administrar os poderes, nosso negócio é política. Sem hesitação, foram interpretados pelas mentes treinadas da administração pública como levianos. Continuar lendo