É claro que quando vamos ver o resultado efetivo das políticas de vigilância e controle, descobrimos que os efeitos sobre o terrorismo foram decepcionantes, para dizer o mínimo. Já a supressão de direitos individuais e liberdades sociais vai de vento em popa, para não falar em espionagem industrial e comercial… “Menos liberdade para mais liberdade” soa um pouco como um texto de Orwell, mas paro por aqui, antes que me chamem de paranóico.
Talvez não seja tão paradoxal. Observe que não foi necessário nenhum golpe, nenhuma derrubada pelas armas de governos eleitos, para dar a partida nesse processo. Wolfgang Schäuble e Jeroem Dijsselbloem, que hoje comandam levianamente a supressão quase oficial da democracia moderna em seu berço, agem em nome de seus eleitores. Na Alemanha, a intenção de voto no CDU, partido de Merkel, está em alta. Interferência, dirá o raciocínio automático, do nacionalismo contra a democracia…
Mas não há interferência neste mundo que obrigue um político a exigir de um povo que, para continuar usando determinada moeda, aceite tornar-se uma colônia. Pelo contrário, a colonização por dívida era comum nos séculos XVIII e XIX, conduzida muitas vezes pelos mesmos governos que, pouco a pouco, instauravam regimes representativos e, pode-se dizer, democráticos em seus próprios territórios. E, sim, quando uma população subscreve a um acordo que a obriga a entregar ativos, define como deve ser a negociação salarial e determina o modo de propriedade das farmácias, ela está aceitando tornar-se colônia.
Mas o colonialismo está além do escopo deste texto. Basta ler o que têm escrito Krugman, Stiglitz ou Münchau (para não falar de David Graeber) para entender em que sentido as aristocracias financeiras da Europa estão propondo à Grécia ser reduzida a colônia – ou, no mínimo, tentando forçar a queda do governo que os gregos escolheram. O que interessa aqui é se perguntar o que aconteceu no intervalo entre aquela leitura horrorizada da democracia feita por Platão, em nome da ordem, e uma defesa cega da versão hipostasiada da democracia, que fazemos hoje, mesmo diante das evidências de que aqueles que têm o controle da ordem (democrática) são justamente os que agem mais incisivamente para explodi-la.
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Acho que tu consegues captar boa parte da complexidade da situação, tanto é que é difícil apreender esse ensaio com uma única leitura.
Só uma coisa que percebi, e fiquei pensando, essa frase “Há muitas maneiras de seqüestrar a democracia sem instaurar uma democracia.” Não seria sem instaurar uma ditadura?
Valeu, Diego, em breve vou reler esse texto.
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Oi Delair, obrigado toque. Você tem razão, misturei as palavras. Agora está corrigido!
Abs
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