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Cheguei a crer que os memes tivessem saído de moda, finalmente. Mas eis que aparece esse das seis coisas quase secretas (e, em geral, bastante genéricas) sobre si mesmo, e me vejo convidado a participar pelo Catatau. Ora, o Catatau é blogueiro obrigatório para qualquer internauta que tenha alguma coisa entre as orelhas. Ou seja, não sou muito de memes, mas quando vem um de alguém com a qualificação que acabo de dar, ai daquele que esnoba a convocação. Além do quê, este é um dos poucos que já recebi a deixar uma abertura para algo mais do que uma lista banal de trivialidades que, em tempos menos espetacularizados (Tutty Vasquez diria que é “evasão de privacidade”…), não teriam interesse para ninguém.
Portanto, agora que encontrei boas desculpas para fazer o de sempre, ou seja, burlar meus próprios princípios, parto para pensar nas tais seis coisas genéricas, quer dizer, secretas. Deixo só mais uma rabugice: elas bem poderiam ser cinco ou sete; a fascinação de nosso tempo pelas listas rigidamente numeradas é coisa em que penso bastante, mas não consigo entender de jeito nenhum. Se ao final deste texto só tiverem sido mencionadas quatro, ou mesmo três coisas, honorável internauta-san, não estranhe. É só para ser do contra, uma mania minha que, de secreta, nada tem.
Começo, então, com minha maior mácula. Um dado sobre mim de que eu mesmo, vez por outra, me pego duvidando. Um absurdo que não sei como foi ter lugar. Pois bem: a verdade é que eu sou diplomado em Economia. Sim, estudei taxas marginais de substituição, curvas IS-LM, caixas de Edgeworth, o ótimo de Pareto e toda aquela velha conversa fiada sobre o indivíduo racional de preferências transitivas. Entretanto, estudar é uma coisa e aprender é outra. Apesar de dois anos enfiado em econometria, não saberei o que fazer se me colocarem diante de um E-views, programinha graças ao qual o economista pensa ter as mesmas qualificações matemáticas de um engenheiro, coitado. Enfim!, economista, é como sou obrigado a preencher no campo profissional de qualquer formulário. É minha pena a pagar. Se bem que talvez o pior de tudo seja quando alguém, por intermédio de algum amigo da onça bem intencionado, descobre em que faculdade estudei e, por associação, pensa que cursei Administração de Empresas. O, la honte! Sei bem que há algo muito errado comigo, mas vamos com calma…
Agora, uma anedota futebolística. Em criança, eu vivia num bairreco chamado Vila Suzana, lá para depois do Morumbi, onde hoje os espigões fazem competição, mas vinte anos atrás não havia nada além do que as sobras da Mata Atlântica. Ou melhor, quase nada. Tinha uma escola, um condomínio e um estádio de futebol. A conseqüência é que, na infância, fui um autêntico são-paulino, quer dizer, quase autêntico, sabe como é. Enfim fui perder o interesse pelo tricolor paulista quando, aos 13 anos, fui pela primeira vez ao Maracanã. Foi um Fla-Flu daqueles, que me fez entender até que ponto o futebol pode envolver elementos telúricos e inconscientes, muito além do estéril “quem ganhou de quem”. Em campo, Romário e Sávio de um lado, Renato Gaúcho e Luiz Henrique do outro. Mas quem decidiu a parada com dois gols foi um cracaço de 45 minutos chamado Rogerinho (quem?!). Não era final de campeonato, nem nada. Aliás, a final daquele ano seria outro Fla-Flu, por sinal um dos jogos mais emocionantes de todos os tempos, mas eu não estava presente por motivo de superstição na família. Nem foi o jogo em si que determinou meu futuro de torcedor. Foram as arquibancadas. Pela primeira vez na vida, entendi que torcedor poderia fazer algo mais do que mascar amendoim e mandar o adversário “chupar”. Quem me conhece há poucos anos provavelmente nem sabe disso, mas meus primeiros colegas de faculdade (sim, em Economia) ainda podiam me ver, vezenquando, com uma velha camisa do São Paulo. Quando rasgou, não me preocupei em comprar outra.
Terceiro fato que deveria ser secreto, mas vem à tona, desta vez inspirado pelas confissões de Pierre Bayard. Admito que sou um pós-graduando em Filosofia que jamais leu 1) a Crítica da Razão Pura, de Kant; 2) a Fenomenologia do Espírito, de Hegel; 3) O Mundo Como Vontade e Representação, de Schopenhauer; 4) Ser e Tempo, de Heidegger: 5) O Ser e o Nada, de Sartre, embora tenha lido outros textos de todos os citados. Três dessas obras estão pegando poeira na minha estante, à espera de algumas férias em que eu quebre a perna ou coisa parecida. (Enquanto isso, li It de Stephen King e Esfera, de Michael Crichton.) Não que isso me impeça de ser pernóstico a ponto de concordar ou discordar das teses de todos esses grandes mitos da filosofia ocidental. E inda faço discursos, explico para “leigos” interessados, respondo a objeções e assim por diante. Quando o encadeamento de um argumento me falta e acabo gaguejando, não faz mal: ponho a culpa na necessidade de traduzir conceitos que aprendi originalmente em francês. Nessa, eu me saio como alguém muito, mas muito chique. É que uma parte do treinamento nas faculdades de filosofia consiste em aprender a fingir que entende determinados assuntos. Mais ou menos como a gente aprende na faculdade de economia, com a diferença de que o filósofo não precisa invocar números sem sentido e, mesmo assim, convence mais. Mistérios da retórica…
Aproveitando que entramos por essa senda, um outro segredo é que não terminei o curso da Sorbonne. Depois de dois anos, fiz prestarem para algo meus créditos de Economia e pulei para a pós em Nanterre. Talvez o tempo restante do curso, que perdi, fosse dedicado justamente ao estudo dos livros que mencionei no tópico anterior. Mas duvido muito. O mais provável é que os professores continuassem preocupados em formatar seus estudantes para produzir dissertações e comentários de texto na mais perfeita “méthode française”. Como eu quero mais é que esse maldito método vá pelos ares, achei melhor pular fora. Isso significa que nunca vou poder pendurar um diploma da Sorbonne na parede. Mas isso nem é tão grave, considerando meu prazer mesquinho de deixar arestas por aparar, a ponto de responder com míseros quatro tópicos a uma proposta que explicitamente exigia seis.
PS: Se eu pensar em mais alguma coisa, atualizo o texto ou adiciono na caixa de comentários.
sua auto ironia é de um paulista acariocado, pelo que entendi você nasceu em Sampa mas mudou pro Rio aos 13 anos, mas não importa muito e te confesso, nunca encontrei paulista com senso de humor, ironizar então merece morte, por aí você poderá entender que nunca consegui “comer” nenhuma da nobreza paulistana, tudo acabava num porrada verbal sem perdão, mas voltando ao que interessa,fui o infeliz espectador da derrota de 1950 e chorei junto com 99999 mil babacas, e me diplomei em engenharia odiando cada dia do meu curso de 5 anos, e trabalhei na maldita engenharia por mais de 40 anos, no meu”tempo” a voz do pai era a voz de Deus, de repente todos os comerciantes judeus queriam que seus filhos fossem “doutores”, e eu só sobrevivi a essa desgraça vestindo capa e espada e me enfiando por esse Brasil grande a comandaR(pra isso eu tinha talento) exercitos de operários, ténicos e colegas recém formados a erguer monumentais feitos, e por falar em filosofia minha geração era metida a ler Nietzsche sem entender patavina, só pra se vangloriar com a mentira de saber quem era Zaratustra e o coitado do filosofo ainda pagou o pato como sdimbolo filosofico da Alemanha Nazi, bom mas disso você entende melhor que eu, mas o que de fato quero falar é das gerações depois da minha, conquistaram a liberdade de escolha, não gostou de engenharia, vamos pro direito, não gostou do direito, vamos pra economia, não gostou de nenhuma dessas profissões vamos pra oceanografia, agronomia, jornalismo, etc, etc, temos muitos etceteras, a escolha é livre e pra você aquele imenso abraço
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Você tem razão quando diz que a auto-ironia não é a mais paulista das práticas… De qualquer forma, eu não nasci em São Paulo não, mas vivi bastante tempo na Ponte (nem sempre) aérea. Longa história, fica pra depois, quando eu tiver um quinto do material pra uma autobiografia como a sua, por exemplo. Sobre o Maracanã, reparei que você remava pelo Botafogo, o que me leva a crer que você torce ou torcia pro time da Estrela Solitária e deve ter boas lembranças de uma certa final de campeonato no Maracanã em 54 (salvo engano), doping e goleada… talvez compense o choro sem sentido de 50?
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Ah, meu chapa, esse texto é antologógico, deveria ser publicado nos Annales: économies, societés, civilisations! Hehehehe! Principalmente após o comentário sobre a Sorbonne e os clássicos da Filosofia! Mas, claro, claro, tenho que deixar o tosco academicismo, tão bem definido por você com um humor inteligente, de lado e me fixar no teu FlaXFlu e sejamos agora tendenciosos: quer coisa mais inteligente que num FlaXFlu decidir depois torcer para o Fluminense? Não meu caro Diego, não há! O texto já é bom, mas por esse mínimo “segredo” já tornou melhor!
Forte abraço!
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Na verdade, foi antes do Fla-Flu. Foi quando vi as arquibancadas. Isso é o principal. A arquibancada…
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Ué, mas porque essa insistência com o número 4? (risos)
Rapaz, belo post, para não variar. Transformou novamente a trivialidade de um meme em algo bem escrito e divertido.
Por acaso vc assinava como “Paulo”, algum tempo atrás?
Quanto aos livros mencionados, e quem com total segurança pode dizer que leu? Não os contaríamos nos dedos? 😉
abração,
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Insistência? Por que insistência? Eu disse pra não estranhar se fossem quatro ou até três. Foram quatro. Onde está a insistência?
Isso é uma daquelas perguntas cuja resposta pode me colocar em maus lençóis? Se for, prefiro me abster de dar uma resposta… (ou seja, já respondi.)
Pelo menos um desses livros, vai… alguém deve ter lido…
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heheh
E a pergunta que não cala: será que cada um deles leu o outro?
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Olha, certamente Kant não leu nem Hegel, nem Heidegger, nem Schopenhauer, nem Sartre. Hegel certamente leu Kant, mas não leu Heidegger, nem Sartre, e duvido que tenha lido Schopenhauer. Schopenhauer certamente leu Hegel, seu ídolo maior no universo, mas não sei se leu Kant, e certamente não leu nem Heidegger, nem Sartre. Heidegger leu tudo e escreveu alguns dos melhores textos que existem até hoje sobre cada um dos outros filósofos mencionados, à exceção de Sartre, que ele considerava um merdinha. Já Sartre certamente leu Heidegger, e não sei se leu os outros…
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Pô, e eu que pensei que não precisaria escrever uma linha a mais dizendo “considerando a linha do tempo” :p
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é que eu sou muito literal…
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Reconheço as cores dessa foto(shopada)… Diz respeito a algo que te trouxe uma tristeza imensa no ano passado, né?
😉
Dizer que tuas crônicas são saborosas e chover no molhado, então pularei essa parte…
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Você reconheceu “as” cores ou reconheceu “que tem” cores? Pois é, alguns times vão além do velho branco e preto, outros não…
Mas diz respeito, sim, inclusive a foto foi tirada na “Noite em que Baldassi se esbaldou”.
E não é Photoshop não, é PhotoFiltre, um programa Di Gratz.
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Um dos melhores memes que já li. 🙂
Bem que eu desconfiava da questão da filosofia… Tinhas um quê de acadêmico.
Mas como Catatau mencionou, tens uma fixação pelo 4. 😀
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Acadêmico, eu? Repilo!!!
Não entendi essa da fixação com o quatro… Meu número preferido é o 19, sempre foi.
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Depois dos enochatos e dos gastrochatos só mesmo os bibliochatos. Concordo que não se deva ler todos os “clássicos” só por imposição de professores e intelectualóides.
E clássico mesmo é Palmeiras x Corinthians, me perdoem os cariocas…
Um abraço. Bruce
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Palmeiras e Corinthians? Putz, que sono…
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Pois é a tal arquibancada… Mesmo assim, ato inteligente!
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e sim sou BOTAFOGUENSE , filhos, netos, mulher e sobrinhos todos da ESTRELA MAIOR, fui atleta remador do Botafogo desde os 16 anos até os 20, campeão carioca e muitas medalhas presenteadas aos filhos e netos e meu amigo, vou te contar, as mais puras e belas amizades surgem entre os compenheiros do esporte, eternos irmãos de se beijarem as faces, e no fim do ano passado chorei a perdas dos dois ultimos amigos que eu conheci no remo, Helio 89 anos e Alexandre 86 anos e eu sou o último daqueles moicanos, que saudade!
abraço
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